As ações que versam sobre divergências de laudos de tipagem são, certamente, aquelas que demandam maior cuidado no momento da elaboração de uma defesa.
É claro que existem aqueles casos absurdos em que se pleiteia indenização por danos morais em vista do risco que o paciente aleatoriamente sofreu de receber uma transfusão “errada”. Sabemos que isso é impossível, pelo que basta demonstrar ao Juiz que este procedimento jamais é realizado sem prévio teste rápido na própria unidade de pronto atendimento.
O grande problema se refere aos testes realizados em gestantes, em que variadas combinações de resultados podem demandar em risco ao feto. Os problemas, como sabemos, geralmente estão associados ao fator Rh.
Temos casos em que houve tão somente um “risco”; casos em que se confirmou a eritroblastose e suas consequências; casos como a “perda de uma chance”, em que o rh negativo não foi diagnosticado na primeira gestação. Enfim, cada processo se refere a uma situação fática específica.
A dificuldade de defesa, por óbvio, se centra na impossibilidade de se justificar uma divergência, já que, em raríssimas circunstâncias, pode haver uma variação aceitável. O empenho, então, estará voltado à descaracterização do dano, seja ele moral ou patrimonial.
Em resumo, apela-se para a argumentação de que não se pode negar a ocorrência de uma falha (ato ilícito); no entanto, esta mesma “falha” não gerou consequências indenizatórias (dano moral), pelo que se está diante de um dissabor típico do cotidiano.
Dissabores sem maiores consequências não se mostram indenizáveis, assim como reconhecido pela jurisprudência. É em menor parcela de casos concretos que realmente se vislumbra o dano efetivo, o desespero, a preocupação aumentada, a dor por uma perda.
São mais numerosos – por sorte – os falsos diagnósticos de rh negativo, com situações em que o próprio médico alerta a paciente acerca dos riscos de incompatibilidade, muitas vezes alarmando quando a um inevitável aborto. E isso acontece até mesmo em casos de terceira ou quarta gestação, em que resta óbvio ao médico assistente que não existe risco algum.
Claro que, no momento do ingresso da ação, a paciente/advogado potencializam eventuais preocupações e fantasiam informações supostamente passadas pelo médico: em muitos casos, são narrados transtornos e sofrimentos impossível de serem suportados por um ser humano comum.
Em uma situação emblemática, obtivemos decisão judicial resumida nos seguintes termos:
Ocorre que, diante dos fatos narrados, não se vislumbra situação de constrangimento ou de vexame a ensejar lesão à personalidade da autora. Restou evidente que o resultado do exame não atormentou a autora, uma vez que sua médica tranqüilizou-a, de pronto compreendendo pelo equivoco do resultado, uma vez que a autora já tinha passado por duas gestações anteriores, com o mesmo pai, sem problemas.
Em outras palavras, o entendimento dominante é de que, mesmo nos casos em que se demonstra falha na prestação do serviço laboratorial, somente exsurgirá dever de indenizar quando for comprovado ou minimamente admissível a ocorrência de um abalo: o dano não pode ser entendido como uma decorrência obrigatoriamente lógica do “erro” cometido pelo laboratório.
Em casos onde simplesmente não há meios de se justificar tecnicamente a divergência, então, deve toda a estratégia de defesa se concentrar na chamada desqualificação do dano moral, excluindo-o ou lançando a níveis mínimo que se mostrem incompatíveis com conceitos elementares do dever de indenizar.
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Daniel Corrêa Silveira, é Advogado Especialista em Direito Civil e Processo Civil, Sócio da Zanetti Advogados Associados, Assessor Jurídico da Sociedade Brasileira de Análises Clínicas - SBAC, da Confederação Nacional da Saúde-CNS e da LAS-Laboratórios Associados.
Contatos: (51) 99263.8988 e daniel@zanetti.adv.br
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